Eu discordo veementemente dessa história que ficar só é bom. Eu por exemplo, não suporto ficar só comigo mesmo! Eu sou um porre! Preciso de companhia para eu me dar sossego!
IVAN MARTINS
É editor-executivo de ÉPOCA
"Ontem eu levei uma bronca da minha prima. Como leitora regular desta coluna, ela se queixou, docemente, de que eu às vezes escrevo sobre “solidão feminina” com alguma incompreensão.
Ao ler o que eu escrevo, ela disse, as pessoas podem ter a impressão de que as mulheres sozinhas estão todas desesperadas – e não é assim. Muitas mulheres estão sozinhas e estão bem. Escolhem ficar assim, mesmo tendo alternativas. Saem com um sujeito lá e outro aqui, mas acham que nenhum deles cabe na vida delas. Nessa circunstância, decidem continuar sozinhas.
Minha prima sabe do que está falando. Ela foi casada muito tempo, tem duas filhas adoráveis, ela mesma é uma mulher muito bonita, batalhadora, independente – e mora sozinha.
Ontem, enquanto a gente tomava uma taça de vinho e comia uma tortilha ruim no centro de São Paulo, ela me lembrou de uma coisa importante sobre as mulheres: o prazer que elas têm de estar com elas mesmas.
“Eu gosto de cuidar do cabelo, passar meus cremes, sentar no sofá com a cachorra nos pés e curtir a minha casa”, disse a prima. “Não preciso de mais ninguém para me sentir feliz nessas horas”.
Faz alguns anos, eu estava perdidamente apaixonado por uma moça e, para meu desespero, ela dizia e fazia coisas semelhantes ao que conta a minha prima. Gostava de deitar na banheira, de acender velas, de ficar ouvindo música ou ler. Sozinha. E eu sentia ciúme daquela felicidade sem mim, achava que era um sintoma de falta de amor.
Hoje, olhando para trás, acho que não tinha falta de amor ali. Eu que era desesperado, inseguro, carente. Tivesse deixado a mulher em paz, com os silêncios e os sais de banho dela, e talvez tudo tivesse andado melhor do que andou.
Ontem, ao conversar com a minha prima, me voltou muito claro uma percepção que sempre me pareceu assombrosamente evidente: a riqueza da vida interior das mulheres comparada à vida interior dos homens, que é muito mais pobre.
A capacidade de estar só e de se distrair consigo mesma revela alguma densidade interior, mostra que as mulheres (mais que os homens) cultivam uma reserva de calma e uma capacidade de diálogo interno que muitos homens simplesmente desconhecem.
A maior parte dos homens parece permanentemente voltada para fora. Despeja seus conflitos interiores no mundo, alterando o que está em volta. Transforma o mundo para se distrair, para não ter de olhar para dentro, onde dói.
Talvez por essa razão a cultura masculina seja gregária, mundana, ruidosa. Realizadora, também, claro. Quantas vuvuzelas é preciso soprar para abafar o silêncio interior? Quantas catedrais para preencher o meu vazio? Quantas guerras e quantas mortes para saciar o ódio incompreensível que me consome?
A cultura feminina não é assim. Ou não era, porque o mundo, desse ponto de vista, está se tornando masculinizado. Todo mundo está fazendo barulho. Todo mundo está sublimando as dores íntimas em fanfarra externa. Homens e mulheres estão voltados para fora, tentando fervorosamente praticar a negligência pela vida interior – com apoio da publicidade.
Se todo mundo ficar em casa com os seus sentimentos, quem vai comprar todas as bugigangas, as beberagens e os serviços que o pessoal está vendendo por aí, 24 horas por dia, sete dias por semana? Tem de ser superficial e feliz. Gastando – senão a economia não anda.
Para encerrar, eu não acho que as diferenças entre homens e mulheres sejam inatas. Nós não nascemos assim. Não acredito que esteja em nossos genes. Somos ensinados a ser o que somos.
Homens saem para o mundo e o transformam, enquanto as mulheres mastigam seus sentimentos, bons e maus, e os passam adiante, na rotina da casa. Tem sido assim por gerações e só agora começa a mudar. O que virá da transformação é difícil dizer.
Mas, enquanto isso não muda, talvez seja importante não subestimar a cultura feminina. Não imaginar, por exemplo, que atrás de toda solidão há desespero. Ou que atrás de todo silêncio há tristeza ou melancolia. Pode haver escolha.
Como diz a minha prima, ficar em casa sem companhia pode ser um bom programa – desde que as pessoas gostem de si mesmas e sejam capazes de suportar os seus próprios pensamentos. Nem sempre é fácil."
IVAN MARTINS
IVAN MARTINS
Dica de texto da Isabella.
Elis Regina - Eu preciso aprender a ser só
9 comentários:
Olá Kurare,como sempre seu blog com temas polêmicos.rs
acho que a opção pela solidão feminina,pode estar embasada em estar bem e em paz e consigo própria.
Por convenções impostas pela sociedade,todos devem ter um par, casar-se.Hoje as coisas são muito diferentes;a mulher ganhou seu espaço,não deve mais submissão ao homem e, digamos está "de igual para igual "com eles.Outro fator que pode levar às mulheres a optarem por ficarem sós,vem do fato de terem vivido uma relação frustrada anteriormente.As expectativas de encontrarem alguém que possa lhes oferecer algo melhor que na primeira relação são menores e até por isso elas tornam-se muito mais exigentes no que tange à qualidade do relacionamento.Elas não querem só alguém pra esquentar seus corpos ao dormir ou para sexo,elas querem muito mais:um homem que às valorize,ame,respeite e divida tudo,os bons ou maus momentos.
"Não se mexe em time que está ganhando" rsrs
A vida já é tão difícil para a maioria dos mortais.Elas não precisam de alguém que dificulte a vida, oque está em voga hoje,e prega-se por aí,é a tal "felicidade" ,seja ela com ou sem alguém.
Ops!Esqueci de assinar o post.E..gostaria de trocar idéias com a tua prima.rs
Renata
Eu concordo com sua prima e hoje, depois de me separar e viver SEM um homem (somente filhos) eu me sinto muito feliz em momento tomando um vinho, com as pernas apoiadas no puff e assistindo TV,
Logico que isto não descarta uma cia aqui outra acolá, pra saciar meus desejos de mulher, pra beijar na boca, dar e receber amor... Isso sempre será bom. Mas que não tinha enquanto casada.
Beijos Carlos
É...eu tenho pensado muito sobre isso ultimamente.Faz 3 meses que me separei.Na verdade eu já me sentia "sozinha" há muitos anos, não fisicamente, mas nas idéias, nas vontades, nos projetos...Pra nós que já temos certa independência deve ser mais fácil estar sozinha.Mais do que nunca sabemos o que queremos e como o Carlos explicou muito bem,o universo masculino em geral, está muito aquém do nosso, em têrmos de conteúdo,essência, de alma.Ficar com alguém sem afinidade,porque?Começar errado de novo? Inventar um novo príncipe encantado? Já sabemos que assim não funciona.Claro que é uma escolha e toda escolha tem consequências,tudo tem um preço.Quanto a não se suportar, eu tenho uma técnica infalível:quando não estou me suportando, vou pra cama dormir.Teve uma noite que fui dormir às 8 horas, e ainda acordei com sono.
Eu heim...ficar sozinha só é bom enquanto a esperança de encontrar um grande amor não nos abandonar, ser auto-suficiente nas questões do coração deve ser terrível!
Eu sou totalmente dependente nesse quesito.
Bjs
É Carlos, seu relato tem realmente algumas verdades, a solidão feminina não é algo para se ter dó, pode sim em alguns momentos ser uma opção, uma privacidade, sem dúvida.
Mas nos dias de hoje às vezes quando observo o comportamento humano, vejo que os homens muitas vezes incorporaram que a mulher é forte, autossuficiente, o que também é outra verdade, mas esquecem em meio há tanta força, expressada pelas mulheres que batalham e vencem suas vidas diariamente, como se não tivesse também a fragilidade, não física, mas a vontade de ser cuidada com afeto, ser reconhecida que ela vence, mas fruto de um esforço que ela enfrenta bravamente ... muitas vezes não encosta sua cabeça em um ombro, pq o homem se afasta destas mulheres. Será que está força toda não está afastando, e nós já estamos nos sentindo bem com está condição?
Hoje lendo seu texto, fiquei a pensar ...
Oi Renata seja bem-vinda ao time de comentáristas!
Só um adendo: o texto não é meu é do Ivan Martins. Ando sem tempo para escrever. Outras prioridades no momento me ocupam.
Um dia vamos reunir essa turma para um papo. Mulheres como vocês é que me dão a esperança que haja um pote de ouro no fim do arco-iris! Parabéns pelos comentários meninas.
Cadê a Fascinada?
Eu só sei que quanto mais próximo do cume o alpinista chega, mais ele fica só. Não que isso seja ruim, mas é mais gostoso quando temos alguém legal ao nosso lado para apreciar-mos juntos a paisagem.
Ou em linguagem mais simples: A solidão é mais palatável a dois.
:0)
Carlos Kurare
Oi Carlos,
Hoje enquanto lia um texto do Ivan Martins, pensei que poderias publicá-lo aqui, concidência, ao acessar teu blog encontro outro texto dele. Parece que não sou a única que gosto do que o Ivan escreve.
Beijos
Neca
Parabéns pela dica de Isabella,pois o texto de Ivan Martins está ótimo de ler, claríssimo, verdadeiro !!! A riqueza da vida interior das mulheres NÃO depende de ninguém além delas mesmas,basta ter um mínimo de sensibilidade, perspsicácia, inteligência, deslumbramento nas coisas mais simples da vida !!! Silvana Bacana.
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